2011-02-08

N

Nunca imaginara que teria coragem para fazer tal coisa. Nunca passou por um minuto sequer em sua mente que seria capaz de cogitar o fim de sua própria existência. Mas era seu desejo. Viver havia se tornado uma tarefa árdua ao lado dela. Não tinha motivos para prosseguir. 'A morte é libertação', dizia para si mesmo, no dia anterior. Obrigou-se a prometer a si mesmo que não voltaria atrás, nem mesmo quando o frio metal do cano do revolver atingisse-lhe o céu de sua boca.
Providenciou tudo rapidamente. Mantinha ao velho revolver de seu pai na gaveta das meias. Achou a munição dentro de uma caixa no armário. Não poderia demorar a ponto de mudar de ideia. Conhecia a si mesmo melhor que qualquer outra pessoa. Não era o tipo de homem que costumava manifestar seus sentimentos.  
Sabia que se levasse muito tempo para fazê-lo mudaria de ideia. Era fraco. Não era digno de viver.  Notou que a vida era apenas dor quando forçava-se a sorrir, mesmo quando estava morto por dentro.  O sofrimento devorava sua alma lentamente. Não podia, não conseguia mais conviver com aquilo. Aquela maldita.
'Por que não matá-la?', perguntou-se uma vez. Não. Não tiraria a vida de ninguém, por mais desprezível, abominável e detestável que fosse. Não sujaria suas mãos com sangue alheio. Deveria poupar a si mesmo de seu sofrimento, pois já não aguentava mais. Aquela vadia não faria isso por ele. Ele sabia. Por isso mesmo daria um fim a sua vida. Ninguém se importaria. Aqueles que realmente o conheciam saberiam que ele estaria muito melhor no instante que a bala atingisse seu cérebro e suas atividades vitais fossem encerradas imediatamente.
Poliu lentamente a arma, carregando-a caprichosamente. Observou o objeto metálico, frio, assustador. Não tinha que ter medo, disse para si mesmo. A morte não traria nada, a não ser um breve torpor confuso e inconsciência. Deveria andar logo com isso.
Levantou-se e andou até o espelho. 'Diga adeus a você mesmo', murmurou, observando o rosto inexpressivo que lhe encarava. Não pensou. Respirou fundo, abriu a boca e enfiara o cano da arma na cavidade. Fechou os olhos. Puxou o gatilho.
Depois disso, nada. Apenas uma forte sensação de ser puxado para todos os lados e comprimido a um ponto minúsculo. Depois, vazio. Sua vida havia chegado ao fim.

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